sexta-feira, 15 de junho de 2007

1.003 & 1.006

INFERNO NACIONAL
Stanislaw Ponte Preta

A historinha abaixo transcrita surgiu no folclore de Belo Horizonte e foi contada lá, numa versão política. Não é o nosso caso. Vai contada aqui no seu mais puro estilo folclórico, sem maiores rodeios.
Diz que era uma vez um camarada que abotoou o paletó. Em vida o falecido foi muito dado à falcatrua, chegou a ser candidato a vereador pelo PTB, foi diretor de instituto de previdência, foi amigo do Tenório, enfim... ao morrer nem conversou: foi direto para o Inferno. Em lá chegando, pediu audiência a Satanás e perguntou:
– Qual é o lance aqui?
Satanás explicou que o Inferno estava dividido em diversos departamentos, cada um administrado por um país, mas o falecido não precisava ficar no departamento administrado pelo seu país de origem. Podia ficar no departamento do país que escolhesse. Ele agradeceu muito e disse a Satanás que ia dar uma voltinha para escolher o seu departamento.
Está claro que saiu do gabinete do Diabo e foi logo para o departamento dos Estados Unidos, achando que lá devia ser mais organizado o inferninho que lhe caberia para toda a eternidade entrou no departamento dos Estados Unidos e perguntou como era o regime ali.
– Quinhentas chibatadas pela manhã, depois passar duas horas num forno de duzentos graus. Na parte da tarde: ficar numa geladeira de cem graus abaixo de zero até as três horas e voltar ao forno de duzentos graus.
O falecido ficou besta e tratou de cair fora, em busca de um departamento menos rigoroso. Esteve no da Rússia, no do Japão, no da França, mas era a mesma coisa. Foi aí que lhe informaram que tudo era igual: a divisão em departamento era apenas para facilitar o serviço dói Inferno, mas em todo lugar o regime era o mesmo: quinhentas chibatadas pela manhã, forno de duzentos graus durante o dia e geladeira de cem graus abaixo de zero pela tarde.
O falecido já caminhava desconsolado por uma rua infernal, quando viu um departamento escrito na porta: Brasil. E notou que a fila à entrada era maior do que a dos outros departamentos. Pensou com suas chaminhas: “Aqui tem peixe por debaixo do angu”. Entrou na fila e começou a chatear o camarada da frente, perguntando por que a fila era maior e os enfileirados menos tristes. O camarada da frente fingia que não ouvia, mas ele tanto insistiu que o outro, com medo de chamarem a atenção, disse baixinho:
– Fica na moita, e não espalha não. O forno daqui está quebrado e a geladeira anda meio enguiçada. Não dá mais de trinta e cinco graus por dia.
– E as chibatadas? – perguntou o falecido.
– Ah!... o sujeito encarregado desse serviço vem aqui de manhã, assina o ponto e cai fora.
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